sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

«Língua Portuguesa é património dos Portugueses e de mais ninguém»?

Por: Gociante Patissa (patissagociante@yahoo.com)
www.angodebates.blogspot.com

O “maldito” acordo de unificação do português, entenda-se entre as variantes brasileira e portuguesa, tem sido alvo de debates, suscitando tanto críticas recheadas de razão, como alguns dos mais infelizes argumentos. O canal televisivo português “Sic”, no espaço “Opinião Pública”, a 21/12, promoveu um fórum com a presença em estúdio de uma ilustre professora de Língua Portuguesa, contando com a participação de cidadãos de Portugal, Angola e Brasil, entre professores, tradutores e não só. Ficamos, nós os outros, a saber que neste acordo só o Brasil, Portugal e Cabo-Verde foram tidos e achados, «o resto virá por arrasto».

Conservadora e efusiva nos argumentos, a pedagoga vê no “Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa” uma questão de “lobby” político do Brasil, arrogando-se do simples facto de ter uma população maior (o Brasil tem oficialmente 120 milhões de habitantes e Portugal 11 milhões). Até porque a língua não é estática, o que pressupõe dizer que os brasileiros, que impõem a unificação, estão sujeitos à dinâmica evolutiva da língua e o neologismo continuará a ocorrer. Ou seja, quantos acordos de unificação mais serão necessários?


«É uma questão de facilitismo», considerou a professora que já garantiu não aderir a tal unificação, evocando ainda que a língua portuguesa tem uma origem, o latim, e uma história a respeitar. Ou seja, que o “h” mudo, o “c” (de acção) embora não se pronunciem, têm a utilidade de, não só evitar eventuais confusões com palavras semelhantes, como também ajudarem na entoação. Pelo que, os apologistas deste acordo para o qual nenhum exercício de auscultação pública foi experimentado, «estão a profanar as origens da língua portuguesa», disse.


«Portugal tem figuras da sua história cujo valor é reconhecido pelo mundo, como é o caso de Camões e as suas obras literárias. E, de repente, tudo isso não conta?», questionou. E com elevado pesar, viu-se a docente trazer cá fora os mais íntimos conceitos de património linguístico ao afirmar que «a língua portuguesa é património dos portugueses e de mais ninguém!». Será? Bom, a professora lá terá “bagagem” suficiente para tão arriscada asserção, embora nos pareça egoísta, considerando que, ao longo da história, Portugal e a língua portuguesa cruzaram a vida de muita gente, que se viu forçada a renunciar alguns dos aspectos mais sagrados da sua cultura, não tendo, hoje, língua própria, ou, se a tem, com pouco poder de expressão.


As participações ao telefone sustentaram, na sua maioria, a tese da professora convidada, defendendo que, «se os brasileiros quiserem falar "fato", por exemplo, em vez de "facto", que o façam, já que o acordo privilegia a pronúncia. Agora, forçar os outros, isso é que não!». E quase todos entendiam o acordo como uma vitória brasileira enquanto potência relativamente superior, perante (um) Portugal frágil, com o medo político de perder espaço. Basta ver que a variante brasileira cede apenas 0,5%, enquanto a variante padrão 1,6%. Tanta é a estranheza do acordo que o Brasil já disse que vai avançar com a implementação das propostas, quer Portugal concorde quer não, realçaram ainda os contestatários. «É um tipo de acordo que uma Inglaterra, por exemplo, jamais aceitaria, com todo interesse e respeito que tenha pelos Estados Unidos da América».

Do lado contra, um cidadão brasileiro realçou que o acordo vem acabar com as dificuldades de compreensão enfrentadas por pessoas que falam a mesma língua, reforçando aproximação. A opinião mais radical foi manifestada por um cidadão português que classificou a professora como fazendo parte de uma elite que vê a história como algo estático, que fica escrito em mármore, repugnando termos excessivos como «profanação». A reacção da professora não se fez esperar. Considerou os argumentos como sendo «de baixeza e usados», e deixou bem claro que não vai adoptar a unificação «para não ensinar erros aos alunos!!!».


Em 1911 dá-se a primeira tentativa de unificação ortográfica dos países lusófonos, que fracassou. O primeiro acordo ortográfico entre Brasil e Portugal data de 1931 e não resultou. Em 1945 houve, em Lisboa, um outro acordo, que também não efectivou a unificação, pois foi adoptado apenas em Portugal. O sistema ortográfico vigente no Brasil é de 1943.

2 comentários:

Alex Amaral disse...

Como brasileiro e "falante" da língua eu, num primeiro momento, discordo da unificação. Note que aqui (somos mais de 180 milhões e não 120 milhões) existem variações das mais diversas, compreensíveis se considerar as dimensões continentais do país. Nem aqui existe de fato uma "unificação", seja na língua falada (mais notória) seja na escrita. Mas não é exatamente por tal motivo que sou contra "num primeiro momento". A real razão é simples: seria algo forçoso, arrogante e unilateral (se considerarmos os 'dominantes', daqui e dali, como um dos 'lados'). Além disso, e não em segundo plano, está a falta de unificação entre as nações e os povos. Como pedir unificação de idioma se não há uma integração de fato entre os países e seus habitantes. África em geral ainda é vista com preconceito aqui. Países lusófonos em África poucos conhecem. Gostaria, primeiro, de maior integração, conhecimento, respeito, depois pensar em unificação linguística.

Unknown disse...

Essa unificação serve apenas aos interesses dos portugueses e seus descendentes (isso é brancos ou que passam por brancos).

A língua portuguesa está destinada a extinção salvo o caso ,muito improvável, que o Brasil se torne uma potência mundial, não só militar como também cultural. A França não é uma potência tão poderosa militarmente quanto a Rússia, porém pelo mundo afora palavras francesas são muito mais conhecidas do que palavras russas, assim também como qualquer outro aspecto de sua cultura, pois a França é uma potência cultural.

Pessoalmente falando já que sou um brasileiro negro, que prefiro o termo de "africano da diáspora", apesar que esse termo deixaria muitos sem saber o que isso quer dizer já que não tem noção do passado da civilização africana dês de suas origens nos grandes lagos até os ataques no continente por inteiro, e também não tem visão p/ o futuro, deixo aqui o meu recado aos meus irmãos angolanos:
De nada tem Angola a ganhar com a continuação do uso da língua portuguesa. Apenas a continuação da extinção do que resta da cultura nativa de seus povos. O complexo de inferioridade que afeta todos os africanos pelo mundo inteiro não é só causado pelo passado, mas também, se não mais, pelo presente. Explico: você vai a escola e não tem nada sobre você, você vê o calendário e tem romanos nos dias da semana, tem romanos nos meses, até os anos são romanos, as histórias, as invenções, a filosofia do que é ou do que deveria ser a humanidade, e por aí vai. A criança cresce acreditando na mentira que o ex-colonizador criou para que seus descendentes jamais perdessem seu poder: Fizeram o povo colonizado acreditar que não poderia existir progresso sem a "ajuda" do colonizador.
É um atraso muito grande para todos os africanos do mundo inteiro que nos seu países de origem a cultura seja ainda guiada pelos interesses dos mesmos povos que a pouco tempo atrás nem os tratava como seres humanos. Pra mim o que Angola precisaria é fazer um movimento como a Nigéria está fazendo agora com a língua Guosa (www.guosa-language.com). É um processo sem dúvida demorado, mas qualquer ser pensante já liberto dos resíduos mentais do imperialismo europeu/árabe sabe que para uma nação ser uma nação ela tem que ter sua própria língua e sua própria história não uma que seu antigos opressores quiseram que eles tivessem.
Para encerrar digo isso: Inglês é a única língua hoje que não corre o risco de extinção. O português que seja falando em Portugal se assim os portugueses quiserem. Dê uma olhada no espelho e me fala se você é português?

Sambajahjah, Brasil

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